ATENÇÃO: Uso de celular como propagação de infecções em UTI’s
Um
estudo realizado no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto (HCFMRP), da USP, mapeou as comunidades de microrganismos que habitam as
unidades de tratamento intensivo (UTIs) da instituição. Os autores da pesquisa
observaram diferenças na composição da microbiota das superfícies das UTIS e,
também, que muitas bactérias potencialmente causadoras de doenças que vivem
nesses locais são resistentes aos produtos de limpeza utilizados para minimizar
o risco de infecções hospitalares. Os resultados foram publicados 28 de agosto
em artigo na revista especializada Frontiers in Public Health.
Segundo
dados dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês)
dos Estados Unidos, naquele país as infecções hospitalares matam cerca de 72
mil pessoas por ano e geram custos estimados de US$ 97 a 147 bilhões. No
Brasil, dados de 2014 referentes às UTIs de 1.692 hospitais apontaram a
incidência de cinco infecções primárias da corrente sanguínea laboratorial a
cada mil catéteres venosos centrais por dia em UTI adulto. Esse tipo de
infecção é um dos mais comuns dentro de hospitais. Essas informações constam no
documento que apresenta as metas do Programa Nacional de Prevenção e Controle
de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (2016-2020). O documento foi
publicado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A
pesquisa no interior de São Paulo foi feita a partir de uma parceria da
Comissão de Controle de Infecções Hospitalares do HCFMRP com pesquisadores da
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP. O
mapeamento utilizou técnicas de sequenciamento de nova geração. São técnicas
que permitem identificar uma quantidade de gêneros e espécies de microrganismos
muito maior do que o cultivo em laboratório.
“Como
não precisa cultivar previamente, conseguimos extrair DNA de microrganismos
cultiváveis e não cultiváveis. Os não cultiváveis requerem algumas condições
que não somos capazes de imitar em laboratório. Normalmente são os mais
extremófilos, ou seja, que vivem nos ambientes mais extremos”, conta a
microbiologista María Eugenia Guazzaroni, professora da FFCLRP e uma das
autoras do estudo. Ela explica que, atualmente, cerca de 97% das bactérias de
qualquer tipo de amostra não são cultiváveis.
A
intenção da pesquisa foi avaliar a qualidade da limpeza concorrente das UTIs
adulta e neonatal do hospital. Limpeza concorrente é um protocolo que determina
que profissionais de enfermagem devem limpar os leitos da UTI diariamente,
ainda durante a internação dos pacientes. O enfermeiro ou enfermeira limpa toda
a área em torno do paciente, incluindo colchão, bombas de infusão e respirador
para diminuir a concentração de microrganismos no ambiente e prevenir
transmissões de um paciente para outro.
ESTUDO DE DIVERSIDADE
Para
mapear as comunidades de microrganismos, foi preciso coletar amostras nas
superfícies onde a limpeza concorrente deve ser realizada. A coleta foi feita
em dias de funcionamento normal, sem que as equipes de enfermagem tivessem sido
previamente avisadas que haveria qualquer inspeção. A ideia era, que, sem o
aviso, seria possível obter um retrato mais fiel da microbiota que habita as
UTIs no cotidiano. Um pesquisador da FFCLRP ficou responsável por extrair as
amostras das superfícies de colchões, camas, maçanetas, respiradores e outros
equipamentos. Ele também recolheu amostras das superfícies de computadores,
celulares e pastas de prontuários que estavam no local. As coletas foram feitas
antes e logo após a limpeza concorrente.
No
laboratório, os pesquisadores usaram o sequenciamento de nova geração para
isolar o DNA de todos os microrganismos presentes nas amostras. A partir desses
dados, eles optaram por fazer algo chamado estudo de diversidade, que usa um
marcador genético para identificar a classificação filogenética dos
microrganismos presentes na amostra. No caso, eles utilizaram o gene do RNA
ribossômico 16S – um gene muito bem conservado porque está relacionado a uma
organela essencial para a sobrevivência das bactérias.
A
lista de microrganismos identificados por esse método inclui habitantes comuns
dos hospitais, como as bactérias dos gêneros Klebsiella, Pseudomonas, Staphylococcus, Enterococcus, Acinetobacter e Escherichia.
No entanto, a distribuição deles variou de uma superfície para outra.
Comparando os dados de diferentes amostras, os pesquisadores verificaram que a
biodiversidade de bactérias é maior na UTI neonatal do que na UTI adulta, o que
pode ter a ver com uma maior quantidade de pessoas que circulam pelo local. E
nas superfícies próximas aos pacientes, a microbiota ganhava uma “impressão
digital” particular, quando comparada com superfícies das estações de trabalho.
A
pesquisa alerta para o fato de que o uso de medicamentos antibióticos não é o
único fator influenciando o aparecimento de bactérias multirresistentes. “O
mais interessante foi ver que depois da limpeza concorrente, mesmo se reduzindo
o número de microrganismos, muitos dos gêneros mais preocupantes, que são os
potencialmente patogênicos, não mudavam. Mesmo que as enfermeiras fizessem a
limpeza concorrente com ciência, como usavam o mesmo produto químico todos os
dias, essas bactérias patogênicas já estavam adaptadas a esse produto químico,
então eram resilientes. Era o mesmo que não passar nada”, destaca Eugenia
Guazzaroni.
Além
da frequência de bactérias resistentes aos materiais de limpeza, a docente da FFCLRP conta que chamou a atenção o fato de
várias amostras extraídas de celulares
apresentarem características similares às das UTIs. “Os celulares
imitavam a microbiota do próprio ambiente, entende? Isso quer dizer que a
enfermeira está menosprezando as bactérias habitantes daquele lugar”, afirma a
microbiologista.
De
acordo com Mayra Menegueti, professora da Escola de Enfermagem de Ribeirão
Preto e integrante da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do HCFMRP, os
resultados do estudo não permitem determinar se a quantidade de bactérias
resistentes à limpeza concorrente é suficiente para que haja transmissão de
doenças. “Ainda queremos fazer outros estudos para determinar qual seria a
carga mínima que passaria para a mão do profissional e poderia passar para
outros pacientes”, diz a docente, que também é coautora do artigo
publicado na Frontiers in Public Health.
FONTE: AQUI
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