As doenças do trabalho no Brasil: um silencioso acidente coletivo de trabalho e as novas práticas de enfrentamento – ética na Saúde e Segurança do Trabalho (SST)
As
doenças do trabalho no Brasil: um
silencioso acidente coletivo de trabalho e as novas práticas de
enfrentamento – ética na Saúde e Segurança do Trabalho (SST)
I
INTRODUÇÃO
Nos
últimos 04 anos, sobretudo nós mineiros, fomos assolados na nossa intimidade
por 02 acidentes do trabalho de proporções catastróficas com repercussões
nefastas para inúmeras famílias e todo um ecossistema cujas consequências
futuras sequer podemos quantificar.
Estas
situações, espantosamente recorrentes, acenderam um alerta e um debate nos
órgãos estatais de fiscalização, na comunidade científica e na sociedade civil
sobre algumas questões relacionadas à gestão da saúde e segurança do trabalho,
tais como: onde ocorreu a falha destes acidentes, quem são os culpados, se
existe uma política e um regramento normativo efetivo de prevenção dos
acidentes de trabalho no país e até quando teremos que conviver com atuais
índices alarmantes de acidentes do trabalho, a negligência, a imperícia e a
imprudência das empresas e dos seus profissionais de SST.
No
diapasão das discussões dos acidentes coletivos do trabalho no Brasil, uma
temática de difícil solução, que envolve importantes questões éticas e está
intrinsecamente relacionada à gestão das empresas relacionada à saúde e
segurança do trabalho, são as doenças do trabalho1 que, no Brasil, vitimizam
milhares de brasileiros, muitos deles de forma crônica e silenciosa, cuja
abordagem ainda carece do mesmo destaque que a mídia evidencia para os
acidentes típicos de trabalho, notadamente com morte, a exemplo dos acidentes
recentemente ocorridos em Mariana/MG e Brumadinho/MG amplamente noticiados nos
meios de comunicação. Os acidentes coletivos, em especial os que decorrem de um
único fato, como rompimento de barragens, com vítimas fatais, provocam maior
divulgação da mídia. Mas não são incomuns os acidentes coletivos que decorrem
da má gestão dos programas de redução de riscos. Pensa-se, por exemplo, nos
casos, cada vez mais comuns, de intoxicações coletivas provocadas pelo uso de
agrotóxicos2, câncer adquirido de uso de agroquímicos, como comprovado
no caso Shell-Basf3, nos 52 casos de silicose em Alpinópolis4
, ou dos 500 mil casos históricos de silicose na Mineração Morro Velho5,
que encerra um terrível drama cotidiano, como também o câncer dos trabalhadores
vítimas do amianto.6
Dados
extraídos do Ibama7 informam que, em 12 anos, morreram duas mil
pessoas por intoxicação com agrotóxicos. Diariamente dão entrada em hospitais
trabalhadores intoxicados por uso de inseticidas, herbicidas ou agrotóxicos nas
lavouras brasileiras. Não estão contabilizados os mórbidos dados sobre os
nascimentos com defeitos congênitos, a intoxicação de bebês pelo leite materno,
o aumento dos casos de doenças mentais, incluindo a depressão e o suicídio,
além de problemas respiratórios e musculoesqueléticos.8 As águas e o
ar também transmitem as substâncias tóxicas com que lidam os trabalhadores
rurais do Brasil, sofrendo diretamente as consequências de seu manuseio,
correto ou não. A correlação de câncer com algumas dessas substâncias já foi
reconhecida em países europeus e em decisões judiciais nos Estados Unidos.9
Por
detrás de cada um desses acontecimentos é possível encontrar vários problemas
na gestão dos programas de redução de riscos do trabalho, que constituem, nos
termos do art. 7º da CR, um direito fundamental dos trabalhadores. A ética
profissional na prestação desses serviços, o interesse de baratear a produção
pela falta de investimentos na prevenção levam à inutilidade dos instrumentos
de gestão, indispensáveis à redução do drástico quadro de acidentes coletivos e
doenças coletivas que acometem os trabalhadores brasileiros.
Com
efeito, os desafios da gestão da doença do trabalho são muitos e perpassam na
dificuldade de avaliação da real estatística das doenças do trabalho no Brasil,
na deficitária fiscalização do trabalho, sobretudo, no que tange à comprovação
do cumprimento pelas empresas prestadoras de serviço especializadas em SST,
responsáveis pela saúde ocupacional da maioria dos trabalhadores formais deste
país, da normatização legal exigida para a gestão da saúde e segurança dos
trabalhadores, notadamente na identificação do nexo entre as doenças
diagnosticadas e o trabalho, da sua notificação formal ao empregador, do
encaminhamento do registro da doença ao Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS), mediante a emissão da Comunicação do Acidente de Trabalho (CAT), e no
enfrentamento dos desafios éticos dos profissionais da medicina do trabalho.
Em
busca de ações e soluções efetivas para a melhoria deste cenário, o Ministério
Público do Trabalho (PRT3) juntamente com os seus parceiros institucionais, o
Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região, o Ministério da Economia (Inspeção do
Trabalho) e a Fundação Jorge Duprat Figueiredo (Fundacentro), concretizou em
2019 a elaboração de um Termo de Referência para nortear, dentre outros
objetivos, a gestão da doença do trabalho implementada pelas empresas
prestadoras de serviço especializadas em SST.
O
Termo de Referência elaborado no contexto deste Projeto e fruto de mais de 20
anos de experiência dos setores de engenharia e segurança do trabalho dos
órgãos partícipes, de livre adesão pelas empresas, está fundamentado no
Princípio da Prevenção, nas normas legais de SST, nos códigos de ética e
profissionais e no balizamento profissional dos médicos do trabalho.
Nos
tópicos abaixo abordaremos o panorama das doenças do trabalho no Brasil, as
dificuldades relacionadas ao seu gerenciamento e os desafios a serem
enfrentados, concluindo com a apresentação do Termo de Referência n. 1 em
Medicina do Trabalho - PROMO 2253.2018 - elaborado para as empresas prestadoras
de serviço especializadas em SST.
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