Como reduzir o risco de contágio e morte dos profissionais de saúde
Victor
Grabois*
Ninguém tem dúvidas sobre a
importância dos profissionais da saúde em prestar uma ampla gama de cuidados,
seja na atenção primária seja nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). Ainda
mais agora. No entanto, profissionais de saúde em todo o mundo estão adoecendo
e morrendo pela Covid-19. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), foram
relatados 22.073 casos do novo coronavírus entre profissionais de saúde, em 52
países, até o dia 8 de abril. Notícia recente dá conta do afastamento de 7
mil profissionais de saúde brasileiros por sintomas respiratórios, sendo que,
dos testados, 1,4 mil deram positivos para a doença e 18 morreram.
Não há, segundo a OMS,
notificação sistemática de adoecimento de profissionais de saúde pelo novo
coronavírus, o que leva a crer que este dado está bastante subestimado. Dados
sobre a porcentagem de casos em profissionais de saúde no total de casos de
Covid-19 divulgados pela OMS citam 3,8% para a China; 14%, na Espanha; e 11%,
na Itália, onde 60 médicos morreram. Nos Estados Unidos, estados divulgaram
porcentagens variando de 16 a 28%.
No Brasil, publicação recente do
Conselho Nacional de Saúde aponta que até 365 mil
profissionais de saúde podem sofrer contágio pelo novo coronavírus, o que
representaria mais de 10% do total de profissionais de saúde atuando no
país. Levantamentos iniciais de universidades públicas brasileiras, que
testam profissionais de saúde, encontraram positividade para o novo coronavírus
entre 25 e 50% dos indivíduos.
Reconhecer o valor e abnegação
dos profissionais de saúde é importante, mas não salvará suas vidas. A proteção
adequada, essa, sim, pode reduzir seu risco de contágio, adoecimento e morte,
assim como a transmissão da Covid-19 dentro dos serviços de saúde.
Possivelmente, aqui, o ditado popular também caiba: melhor prevenir do que
remediar.
Profissionais de saúde se
contagiaram em casa e circulando em transporte coletivo? Sim, é possível, mas isso não explica a intensidade de seu
contágio e adoecimento. Provavelmente, vamos encontrar respostas em como
os profissionais de saúde se expõem durante o cuidado de pacientes da
Covid-19 e como as instituições de saúde se organizam para cumprir sua missão
de cuidar.
Um exemplo de notícia do mundo
real vem de São Paulo, a maior cidade do Brasil e a mais atingida pela
pandemia. Pesquisa do Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo,
realizada com 627 servidores municipais, mostra uma disponibilidade abaixo de
50% para itens relevantes para prevenção da transmissão da doença. Quase um
terço dos profissionais afirmou ter 60 anos ou mais — ou seja, também pertence
ao grupo de risco.
Os fatores contribuintes para aumentar o risco
dos profissionais de saúde seriam, entre outros:
Trabalhar em ambientes de alto
risco;
Falta ou uso inadequado dos
Equipamentos de Proteção Individual (EPIs);
Não valorização da higienização
das mãos nos cinco momentos preconizados pela OMS (problema antigo que, agora,
tornou-se ainda mais grave);
Longas horas de plantão;
Reconhecimento tardio ou baixa
suspeição quanto à ocorrência da Covid-19 em sintomáticos respiratórios;
Além da sobrecarga de trabalho e
estresse significativo;
Também são fatores importantes a
insuficiência ou inadequação de capacitações na prevenção de infecções
associadas ao cuidado;
A existência de ambientes com
ventilação, refrigeração e exaustão inadequados;
Além de fluxos únicos de
movimentação de pacientes sintomáticos e não sintomáticos; e Ambientes de
cuidado sem área suficiente para o distanciamento mínimo seguro.
Proteger os profissionais significa disponibilizar EPIs em quantidade e
qualidade suficientes e capacitá-los para seu uso adequado; oferecer segurança
psicológica aos trabalhadores da saúde, respondendo claramente às suas
preocupações, dúvidas e medos; facilitar ao máximo a higienização das mãos; e
avaliar se os serviços de saúde existentes respeitam as normas da Anvisa e de
órgãos de referência (CDC/UA; OMS/Opas). A Organização Mundial da Saúde propõe
a estruturação de centros de atendimento a sintomáticos respiratórios, com
entradas diferentes de profissionais e pacientes; manutenção de distâncias
seguras em salas de espera e de triagem e acolhimento; uso de paredes de vidro
ou plástico, e separação de pacientes suspeitos dos confirmados com Covid-19,
seja na atenção primária, pronto atendimento ou na internação.
Por outro lado, é relevante
responder ao subdimensionamento de equipes de saúde na atenção primária, nas
Unidades de Pronto Atendimento e nos hospitais. Uma resposta efetiva à pandemia
depende de equipes mais completas, ainda mais considerando que parte da força
de trabalho em saúde já está adoecendo.
Profissionais que estejam
protegidos e seguros são um pré-requisito para a saúde dos trabalhadores da
saúde, da população em geral e para a manutenção dos serviços, constituindo um
dever primário dos gestores de saúde. Devem ser prioritários na testagem, e
isso também é proteção. A colaboração entre todos gestores públicos, em todos
os níveis e desses com o setor privado é fundamental. É necessário reduzir
assimetrias preexistentes e que, se mantidas, produzirão, por sobrecarga
do SUS, além do adoecimento dos profissionais, maior iniquidade no cuidado.
Oferecer condições
adequadas para o exercício profissional é responsabilidade dos gestores, que
devem assumir esse compromisso em todos os níveis, na Saúde e fora dela. Sim, é
possível proteger os profissionais de saúde contra a Covid-19.
*Victor Grabois é pesquisador da
Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) e presidente da Sociedade
Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do Paciente (Sobrasp).
FONTE: AQUI
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