Conclusões Finais da CPI da PREVIDÊNCIA SOCIAL do Senado Federal: o mais grave problema decorre da vulnerabilidade das fontes de custeio do sistema
Finalmente
e de forma mais objetiva apresentamos a seguir um breve resumo dos principais pontos abordados no relatório da CPI da Previdência,
com as conclusões que julgamos pertinentes e necessárias a orientar qualquer
discussão e deliberação sobre a Previdência Social do Brasil.
a) O Princípio do não retrocesso
social
Conforme
aduz o jurista Ingo Sarlet, o princípio constitucional do não retrocesso, no
âmbito do direito brasileiro, está implícito na Constituição Federal de 1988, e
decorre do princípio do Estado democrático e social de direito, do princípio da
dignidade da pessoa humana, do princípio da máxima eficácia e efetividade das
normas definidoras de direitos fundamentais, da segurança jurídica, da proteção
da confiança, entre outros.
O
Supremo Tribunal Federal ao tratar deste princípio tem se manifestado, mesmo
que ainda de forma mais isolada, na direção de considerar o princípio, e
aplicá-lo, na análise do caso concreto, senão vejamos:
[…] A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL
COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER
PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. – O princípio da proibição do retrocesso
impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam
desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação
social em que ele vive. – A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos
a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde
ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação
desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculos a que os
níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser
ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina. Em consequência
desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais,
assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena
de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de
frustrar – mediante supressão total ou parcial – os direitos sociais já
concretizados.- (ARE 639337 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma,
julgado em 23/08/2011, DJe-177 DIVULG 14-09-2011 PUBLIC 15-09-2011 EMENT
VOL-02587-01 PP-00125).
A
particularidade do princípio da proibição de retrocesso social está, pois, na
prevalência do caráter negativo de sua finalidade. Dizemos prevalência porque existe,
ainda que em menor escala, um elemento positivo na finalidade do princípio em
tela: é dever do legislador manter-se no propósito de ampliar, progressivamente
e de acordo com as condições fáticas e jurídicas (incluindo-se as
orçamentárias), o grau de concretização dos direitos fundamentais sociais,
através da garantia de proteção dessa concretização à medida que nela se
evolui. Vale dizer, proibição de retrocesso social não se traduz em mera
manutenção do status quo, antes significando também a obrigação de
avanço social.
A
declaração de direitos humanos da ONU estabelece no seu art. 25, I, que “todo
homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e sua família
saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos
e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de
desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda de
meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.
Trata-se,
portanto, de direito humano à proteção social suficiente e capaz de atender a
essas mínimas exigências.
Nesse
contexto, é lícito o direito humano à resistência. A extinção, ou redução de
garantias mínimas nada mais representam do que a ruptura da ordem democrática
constitucional promovidas por movimentos antirrepublicanos, que desconsideram
princípios fundamentais como o da solidariedade e da unidade social como bem
nacional indisponível e intangível.
Nossa
Constituição estabelece de forma clara e inequívoca que o Brasil é uma
República cujos objetivos fundamentais são:
I
- construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II
- garantir o desenvolvimento nacional;
III
- erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e
regionais;
IV
- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação.
Assim,
com a responsabilidade de Legisladores que detém a outorga do mandato por livre
e soberana vontade popular, e em face do juramento que todos fazemos no dia de
nossa posse, qual seja o de cumprir e fazer cumprir a Constituição Federal,
não nos é permitido transgredir o texto constitucional, mas preservá-lo,
abstendo-se de frustrar – mediante supressão total ou parcial – os direitos
sociais já concretizados, como bem assinala o Ministro Celso de Melo, do
STF, em manifestação antes citada.
Registre-se,
que dados recentes, demonstram que o indicador da desigualdade social,
medido pelo Índice de Gini, que estava em linha descendente há 22 anos, voltou
a subir, como demonstra o gráfico a seguir elaborado a partir de cálculos da
FGV Social:
Gráfico
15 -Índice de Gini da Renda Domiciliar per capita (1994-2016)
A
desigualdade voltou a aumentar no país. Ao atingir patamares recordes em 2016,
o desemprego fez com que a disparidade da renda domiciliar per capita no Brasil
registrasse o primeiro aumento em 22 anos, desde o início do Plano Real.
O
indicador — que varia de zero a um e que, quanto mais perto de zero estiver,
mais igualitária é a sociedade — chegou a 0,5229 no ano passado, alta de 1,6%
em relação ao ano anterior. Com o resultado, o Brasil voltou três anos no tempo
e anulou a redução da desigualdade registrada em 2014 e 2015.
Trata-se
de retrocesso social reflexo, derivado de política econômica inadequada, que
reclama medidas de proteção social eficientes, capazes de amortecer e impedir a
ruptura do tecido social.
Assim,
não se pode admitir, que em momentos de absurda redução da atividade econômica,
caracterizada por um período prolongado de recessão que beira a depressão
econômica, pretenda-se impor à sociedade brasileira como solução à crise atual,
a extinção e a redução de direitos sociais necessários e imprescindíveis à
mínima existência humana digna.
Por
esses pressupostos e fiéis aos princípios fundamentais erigidos pela
Constituição brasileira, é que nos é imposto o dever de evitar retrocessos
sociais incompatíveis com a ordem jurídica vigente, pois se implementados
importariam em relativização inadmissível de garantias plenas da cidadania.
E
é nessa perspectiva que a CPIPREV o Senado Federal assevera que qualquer
reforma constitucional que não concilie estes princípios estará maculada pela
inequívoca ofensa à ordem constitucional e, como consequência, tida por
inconstitucional.
b) Seguridade Social e Previdência
Social (financiamento)
Ao
longo deste relatório, e pelas manifestações das mais diversas autoridades e
especialistas, ficou demonstrado que o plano de custeio da previdência social
comporta as receitas da seguridade social tais como arroladas no art. 195 da
CF, que dispõe que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de
forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das
seguintes contribuições sociais:
I
- do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei,
incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
a)
a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a
qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo
empregatício; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
b)
a receita ou o faturamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de
1998)
c)
o lucro; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
II
- do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo
contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de
previdência social de que trata o art. 201; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 20, de 1998)
III
- sobre a receita de concursos de prognósticos.
IV
- do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele
equiparar. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003).
Não
há, portanto, dissociação de receitas, mas sim sua perfeita e harmônica
integração, na forma como preconizada pelo art. 194 da CF.
Tal
fato é reforçado pela literal disposição da Lei nº 8.212, de 1991, que dispõe
sobre o plano de custeio e organização da seguridade social, dispondo, nos seus
arts. 10 e 11, o seguinte:
“Art.
10. A Seguridade Social será financiada por toda sociedade, de forma direta
e indireta, nos termos do art. 195 da Constituição Federal e desta Lei,
mediante recursos provenientes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios e de contribuições sociais.
Art.
11. No âmbito federal, o orçamento da Seguridade
Social é composto das seguintes receitas:
I
- receitas da União;
II
- receitas das contribuições sociais;
III
- receitas de outras fontes.
Parágrafo
único. Constituem contribuições sociais:
a)
as das empresas, incidentes sobre a remuneração paga ou creditada aos segurados
a seu serviço; (Vide art. 104 da lei nº 11.196, de 2005)
b)
as dos empregadores domésticos;
c)
as dos trabalhadores, incidentes sobre o seu salário-de-contribuição; (Vide
art. 104 da lei nº 11.196, de 2005)
d)
as das empresas, incidentes sobre faturamento e lucro;
e)
as incidentes sobre a receita de concursos de prognósticos
Não
há, portanto, sob o prisma constitucional e legal, uma segregação de receitas,
sendo que todas elas são derivadas de contribuições sociais legalmente
instituídas e concorrem para o financiamento das despesas sociais constituídas
pelas três áreas que integram a seguridade social: saúde, assistência e
previdência social.
Tanto
é assim, que o próprio art. 8º da Lei nº 8.212, de 1991, estabelece que as
propostas orçamentárias anuais ou plurianuais da Seguridade Social serão
elaboradas por Comissão integrada por 3 (três) representantes, sendo 1 (um) da
área da saúde, 1 (um) da área da previdência social e 1 (um) da área de
assistência social.
E,
nos termos do art. 165, § 5º, III, a Constituição determina que se organize em
único orçamento, o da seguridade social. O art. 38 da Lei nº 13.473, de 8 de
agosto de 2017, que dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e execução da
Lei Orçamentária de 2018 e dá outras providências, assim dispõe:
“Art.
38. O Orçamento da Seguridade Social
compreenderá as dotações destinadas a atender às ações de saúde, previdência e
assistência social, obedecerá ao disposto no inciso XI do caput do art.
167, nos arts. 194, 195, 196, 199, 200, 201, 203 e
204 e no § 4o do art. 212 da Constituição e contará, entre outros, com
recursos provenientes:”
Verifica-se,
que o tratamento da despesa pública originada pela seguridade social recebe
tratamento sempre agregado, assim como o seu financiamento, sendo, portanto,
inadmissível a contabilização de eventual insuficiência financeira do sistema,
a partir da seleção de fontes específicas para o cotejo de satisfação de
despesas de origem previdenciária exclusiva.
Assim,
para esta CPIPREV do Senado Federal, após a oitiva de todas as partes,
inclusive do próprio Secretário da Receita Federal do Brasil, e das informações
contidas nesse relatório, ficou claro e evidente, e em razão da própria
natureza tributária das contribuições sociais devidas à seguridade social, que
a contabilização de eventuais insuficiências financeiras ou do excesso de
arrecadação, devem considerar o conjunto das contribuições sociais
estabelecidas no art. 195 da CF, e no art. 11 da Lei nº 8.212, de 1991.
c)
contribuição da União
O
art. 250 da Constituição estabelece o seguinte:
“Art.
250. Com o objetivo de assegurar recursos para o pagamento dos benefícios
concedidos pelo regime geral de previdência social, em adição aos recursos
de sua arrecadação, a União poderá constituir fundo integrado por bens,
direitos e ativos de qualquer natureza, mediante lei que disporá sobre a
natureza e administração desse fundo. (Incluído pela Emenda Constitucional nº
20, de 1998)
Consciente
de que a seguridade social está exposta a variáveis de ordem econômica e
atuarial, o Constituinte derivado, já em 1998, estabeleceu a necessidade de
constituição do Fundo do Regime Geral da Previdência Social (FRGPS), para que a
União pudesse, em caráter adicional, assegurar os recursos necessários
ao pagamento dos benefícios concedidos pelo RGPS.
O
FRGPS, criado pelo art. 68 Lei Complementar nº 101 de 04 de maio de 2000, (Lei
de Responsabilidade Fiscal – LRF) não é, na exata dicção do texto
constitucional, responsável exclusivo pela satisfação das despesas do RGPS,
pois suas fontes de receita (bens, direitos e ativos) são apenas adicionais aos
recursos arrecadados pelo RGPS, no âmbito da seguridade social, e aos recursos,
orçamentários aportados pela União, nos termos do “caput” do art. 195 da
Constituição.
Assim,
mesmo se considerarmos o conjunto das fontes a seguridade social para a
satisfação dos benefícios do RGPS, estaríamos adotando metodologia incompleta,
pois se faz necessário considerar que eventual insuficiência financeira deverá
ser complementada pela União com recursos do orçamento fiscal.
Sobre
este aspecto, registre-se, por oportuno, que a Lei nº 8.212, de 24 de julho de
1991, que dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de
Custeio, e dá outras providências, estabelece no texto do parágrafo único
do art. 16 que a União é a responsável pela cobertura de eventuais
insuficiências financeiras da Seguridade Social, quando decorrentes do
pagamento de benefícios de prestação continuada da Previdência Social, na forma
da Lei Orçamentária Anual.
Tecnicamente,
é possível afirmar com convicção que inexiste déficit da Previdência Social
ou da Seguridade Social, e que o eventual resultado negativo deve ser
observado sobre o prisma do conjunto agregado das contas públicas, que poderá
resultar em déficit ou superávit a depender do comportamento da arrecadação e
da administração das despesas em um determinado exercício fiscal.
Nesta
ótica, são absolutamente imprecisos, inconsistentes e alarmistas, os argumentos
reunidos pelo Governo Federal sobre a contabilidade da Previdência Social, cujo
o objetivo é aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 287, de
2016.
d) inclusão das despesas com
servidores civis e militares
A
inclusão das despesas com pagamentos de benefícios de aposentadoria e pensão
devidos aos servidores públicos civis e militares na contabilidade da
Seguridade Social carece de amparo legal e constitucional.
O
citado art. 250 da Constituição Federal é elucidativo quando consigna que “com
o objetivo de assegurar recursos para o pagamento dos benefícios concedidos
pelo regime geral de previdência social poderá constituir fundo
integrado por bens, direitos e ativos de qualquer natureza, mediante lei que
disporá sobre a natureza e administração desse fundo.”
E
a que fundo se refere o art. 250 da CF? Justamente aquele instituído pelo art.
68 da LRF, qual seja o FRGPS.
É
determinação constitucional que sequer comporta interpretação, dada a sua
exacerbada literalidade e ao comando expresso de que somente despesas com
benefícios do RGPS podem ser satisfeitos com esses recursos.
A
segregação dessas despesas é evidenciada pelo art. 249 da CF, que prevê que
“Com o objetivo de assegurar recursos para o pagamento de proventos de
aposentadoria e pensões concedidas aos respectivos servidores e seus
dependentes, em adição aos recursos dos respectivos tesouros, a União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão constituir fundos
integrados pelos recursos provenientes de contribuições e por bens, direitos e
ativos de qualquer natureza, mediante lei que disporá sobre a natureza e
administração desses fundos”. Contudo, na esfera da União, tal fundo não foi
constituído.
No
que se refere aos militares, vale referir que o Poder Executivo enquadrava até
2015, no âmbito do orçamento público, os dispêndios com proventos de militares
inativos na função “Previdência Social” e na esfera “Orçamento da Seguridade
Social”.
No
entanto, a partir de 2016, optou por classificar o pagamento desses inativos na
função “Defesa Nacional” e na esfera “Orçamento Fiscal”.
Essa
alteração de posicionamento baseou-se no Parecer nº 00016/2015/ASSE/CGU/AGU, de
2 de junho de 2015, no qual a Consultoria-Geral da União da Advocacia-Geral da
União (CGU/AGU) emitiu entendimento afirmando que não é possível tratar do
Regime Próprio de Previdência dos Militares, por ausência de um Plano de
Custeio paralelo a um Plano de Benefícios.
Além
disso, os integrantes das Forças Armadas não contribuem para a Previdência.
Toda a contribuição é feita pela União. Os descontos feitos nos pagamentos de
militares são destinados exclusivamente para custear pensões que são
pagas aos familiares em caso de morte.
Portanto,
absolutamente descabida a inclusão dessa despesa como financiável pelas fontes
de receita da seguridade social.
Em
relação ao Regime Próprio de Previdência do servidor público federal (RPPS),
somente com a edição da Emenda Constitucional (EC) nº 3, de 17 de março de
1993, é que, pela primeira vez, constitucionalizou-se a ideia de que os
servidores públicos participam do custeio de suas aposentadorias.
Até
então, essencialmente, os servidores contribuíam apenas para o financiamento
das pensões por morte.
Portanto
além do óbice do art. 250 da CF, constata-se a ausência de contribuição social
suficiente não apenas dos servidores, mas da própria União na qualidade de
empregadora, a sustentar que a despesa com esses benefícios possam vir a
integrar a seguridade social.
Para
esta Relatoria, portanto, são infundados, inverídicos e inconstitucionais os
argumentos e o método que inclui essas despesas como integrantes da seguridade
social.
e) Projeções
Ao
longo deste relatório é possível verificar a inconsistência de dados e de
informações anunciadas pelo Poder Executivo, que desenham um futuro
aterrorizante e totalmente inverossímil.
As
projeções do Governo levam em conta um envelhecimento da população exagerado,
ao passo que consideram um crescimento do PIB muito abaixo da média histórica
nacional. Tais falhas exacerbam a previsão futura de necessidade de
financiamento do RGPS, o que não condiz com a realidade dos fatos.
Quando
examinamos, por exemplo, a expectativa de sobrevida aos 65 anos de idade, por
Estado, no Brasil, vemos que existem diferenças marcantes. Enquanto ela pode
chegar a mais de 20 anos para mulheres em sete Estados, na maior parte deles
ela é inferior a 19 anos, e pode chegar a apenas 17 anos em Rondônia e Roraima.
Para os homens, ela oscila entre 14,6 anos e 18,1 anos, mas a maioria dos
Estados – notadamente os mais pobres – tem expectativas de sobrevida entre 15 e
17 anos, conforme dados do IBGE.
Ocorre,
entretanto, que as condições de saúde, como a capacidade física e mental, não
são as mesmas experimentadas nos países desenvolvidos, que via de regra são
utilizadas como exemplo,
A
solução para o aumento da expectativa de vida não está na redução pura e
simples de direitos, ou na visão pessimista de que uma maior proporção de
idosos é um problema a ser enfrentado. O remédio, dentre outras medidas, está:
1)
na inclusão previdenciária, para que mais trabalhadores passem a contribuir,
reduzindo-se a informalidade;
2)
no aumento na geração de empregos e da atividade econômica, que possibilite aos
jovens inserção produtiva na economia, e;
3)
na superação das barreiras educacional, digital e tecnológica, entre outras,
que impedem ganhos de produtividade na economia do Brasil.
Qualquer
regime previdenciário sempre exigirá de seus gestores uma revisão periódica de
suas projeções em busca do perfeito equilíbrio financeiro. Todavia, a eventual
ou sazonal insuficiência financeira não pode ter como única alternativa a
restrição de direitos, uma vez que a concessão de benefícios pressupõe a solvência
do sistema, e a efetivação de um direito já adquirido ou em processo de
aquisição.
Nestes
termos, é possível concluir que as projeções apresentadas pelo Governo para a
Previdência Social (RGPS) foram elaboradas com a finalidade única de justificar
a necessidade de uma reforma constitucional que só ajusta a despesa,
desconsiderando os graves problemas verificados na parte do financiamento.
Registre-se,
ainda, que após análise criteriosa das informações constantes desse relatório,
restou demonstrado também, que o Regime Próprio dos servidores públicos
federais (RPPS) e as pensões militares apresentam previsão de déficit futuro
estável em relação ao PIB com tendência a diminuição desta proporção, fruto das
medidas já adotadas na Emendas Constitucionais nºs 19, 20, 41 e 47, razão pela
qual se tornam injustificáveis novas alterações constitucionais em relação a
esse quesito.
f) DRU
No
que se refere à Desvinculação das Receitas da União (DRU), o relatório
observou, a partir das diversas discussões sobre o tema, que se trata de uma
distorção injustificável, e que foi implementada inicialmente com o objetivo de
aumentar a arrecadação da União sem que esta arrecadação fosse repartível com
estados, distrito federal, e municípios.
A
manifestação das autoridades governamentais, como é o caso da Secretária do
Tesouro Nacional, Sra. Ana Paula Vescovi, indicam que este mecanismo, não gera
qualquer efeito orçamentário, na medida em que sustenta que o “orçamento da
seguridade social está aí com um déficit de R$136 bilhões, a DRU desvinculou
R$60 bilhões, mas o Tesouro aportou R$136 milhões. Ou seja, foi muito mais do
que a DRU. E isso nós vemos aqui até o ano de 2016.”
Não
há razão para que este malabarismo de contas persevere, até porque não há a
ocorrência de superávit, mas sim de necessidade adicional de financiamento,
agravada nos últimos anos pela situação econômica recessiva que impacta
negativamente na arrecadação das contribuições sociais.
Além
disso, como já reportamos inúmeras vezes, esses recursos capturados pela DRU
compõem o FRGPS, razão pela qual, sob todos os pontos de vista, deve ser
revogada a emenda constitucional que insiste na sua perpetuação.
g) desconsideração de renúncias e
desonerações
Não
há como se produzir um diagnóstico fidedigno sobre as contas da Previdência
Social, sem considerar o real potencial de financiamento do sistema.
A
constante manipulação das contribuições sociais como objeto de política
econômica, como a adoção de medidas anticíclicas, por exemplo, não podem trazer
para os segurados da Previdência Social e beneficiários da Seguridade Social o
ônus que é da sociedade de forma geral.
Não
é por outra razão que tanto a Constituição Federal como a legislação
infraconstitucional estabelecem a responsabilidade da União como garantidora do
pagamento dos benefícios previdenciários.
E
não poderia ser diferente, pois se as fontes da seguridade social socorrem o
caixa da União, compete a ela a suplementação de eventuais ou sazonais
insuficiências financeiras.
O
nosso relatório recomenda que seja reavaliada também toda a política de
desonerações e de renúncias fiscais, de tal forma que a contribuição equitativa
de todos os segmentos econômicos impacte positivamente no resultado da
arrecadação das fontes da seguridade social e, por conseguinte, deixe de onerar
desproporcionalmente os setores que mais respondem pela arrecadação atualmente.
Um
dos exemplos mais gritantes é a desoneração das exportações do agronegócio. A
falta de equilíbrio e de distribuição equitativa do custeio importa,
necessariamente, maior oneração de outros setores econômicos, como o da
indústria, comércio e serviços, o que não é justo.
h) extinção do REFIS na sua
concepção atual
Ninguém
está livre de problemas financeiros que resultem na suspensão temporária ou
permanente do pagamento de tributos.
Todavia,
no Brasil, o parcelamento e reparcelamento de dívidas tributárias (REFIS), com
perdão de multas, juros e correção monetária e encargos legais, tornou-se algo
recorrente, mesmo em períodos de prosperidade econômica.
E
esta prática tem se tornado uma constante, fazendo crer que dela muitos
contribuintes têm se utilizado de forma deliberada, como política
administrativa de planejamento tributário, em prejuízo da seguridade social.
Como
nos últimos tempos, a cada intervalo de três ou quatro anos, o Congresso
Nacional coloca em pauta matéria legislativa com este objetivo, desconfia-se
que muitos contribuintes resolvam, simplesmente, suspender total ou
parcialmente o recolhimento obrigatório de seus tributos, confiando que poderão
saldá-los em condições mais vantajosas e com generosos parcelamentos, em
momento oportuno mais adequado aos seus interesses, que evidentemente não são
os da sociedade e muito e menos da seguridade social.
A
dívida ativa de natureza previdenciária segundo informações da PGFN seria capaz
de suportar só ela, a necessidade adicional de financiamento das despesas
previdenciárias de três orçamentos seguidos da seguridade social, pois
ultrapassa a casa dos R$ 460 bilhões de reais.
Embora
este Congresso Nacional tenha novamente aprovado um novo REFIS neste ano,
derivado da Medida Provisória nº 783, de 2017, está claro que está prática é
perniciosa e representa um estímulo à sonegação e à livre concorrência, pois
além de sonegarem tributos promovem concorrência desleal com os contribuintes
adimplentes.
O
relatório desta CPIPREV defende uma legislação de caráter permanente e
ordinário, que contemple as situações realmente justificáveis de suspensão do
pagamento dos tributos, para que possam acessar, em condições mais favoráveis,
o pagamento parcelado de tributos não recolhidos.
A
legislação que é generosa em conceder o perdão de dívidas e oferecer
parcelamentos benevolentes aos sonegadores da seguridade social não pode pretender
ser rigorosa com o corte da despesa de benefícios dos miseráveis e dos
trabalhadores, aposentados e pensionistas desse país. Seria o fim da República,
tamanho o contrassenso.
i) Fraudes e erros no pagamento de
benefícios
Esta
CPIPREV, a partir do relato de autoridades do Governo, do Ministério Público,
Poder Judiciário, Polícia Federal e do INSS, e de depoimentos recolhidos,
constatou que a gestão administrativa para concessão e manutenção de benefícios
da Previdência Social está sujeita a fraudes e erros que impactam negativamente
as contas do RGPS.
Na
maioria dos casos, os crimes não são praticados por segurados comuns, mas por
quadrilhas que vêm se especializando em fraudar a Previdência Social.
Neste
sentido a relatoria desta CPIPREV recomenda aos órgãos competentes a
estruturação de uma estratégia permanente e integrada de combate às fraudes e
crimes contra a Previdência Social, nos moldes da Estratégia Nacional de
Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro – ENCCLA, assim como a adoção de mecanismos
de verificação e revisão periódica de benefícios, respeitando sempre o sagrado
direito do segurado a ampla defesa e ao devido processo legal.
j) reestruturação das
auditorias-fiscais, PGFN, e serviços do INSS
Relatos
recolhidos por esta CPIPREV demonstram que a Administração Pública Federal, em
que pese as contingências orçamentárias atuais, precisa apoiar as estruturas de
arrecadação, cobrança da dívida ativa, e de prestação de serviços aos segurados
do RGPS.
Tais
estruturas vêm sofrendo com o contingenciamento de recursos, que prejudicam a
arrecadação de contribuições sociais. O objetivo deveria ser o exatamente o
inverso, com o fortalecimento das fiscalizações, autuação de sonegadores e
maior eficácia na cobrança da dívida ativa.
O
grande contingente de servidores do INSS e da Secretaria da Receita Federal do
Brasil que poderão, em curto prazo, deixar o serviço ativo, demanda do Poder
Executivo uma estratégia que permita não somente que haja a reposição desses
servidores – hipótese de aumento de despesa com pessoal, excepcionalizada,
inclusive, pela Emenda Constitucional nº 95/2016 – como que haja a adequada
transmissão de conhecimentos e experiências. Assim, as instituições preservarão
o conhecimento acumulado e evitarão a perda da memória administrativa em
relação às questões da Previdência Social.
Além
disso, a demora na concessão e revisão de benefícios concedidos em virtude de
incapacidade temporária, além de prejudicarem os segurados que necessitam de
prestação eficiente desses serviços, implica na manutenção de benefícios que
podem não mais atender aos requisitos legais para a sua manutenção.
Por
outro lado, o Poder Executivo deve intensificar o uso das tecnologias de
informação e Inteligência na fiscalização tributária de forma a aumentar a
produtividade e eficiência do Fisco, e ampliar os quantitativos de
Auditores-Fiscais dedicados à arrecadação da seguridade social, dado o caráter
essencial e estratégico dessas receitas para o equilíbrio fiscal e orçamentário
da União.
Em
virtude disso, esta Relatoria sugere esta relatoria que a CPIPREV recomende ao
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, e ao INSS, o levantamento dos
cargos efetivos vagos relativos aos servidores do INSS, Auditores-Fiscais do
Trabalho e da Receita Federal do Brasil, e Procuradores da Fazenda Nacional, a
fim de que seja fixada uma estratégia para a mais rápida reposição desses
servidores em prol da arrecadação das contribuições sociais devidas à
seguridade social e melhor prestação de serviços aos segurados do RGPS.
Tal
medida deve ser acompanhada das providências necessárias, na esfera
administrativa e orçamentária, para que a Secretaria da Receita Federal do
Brasil, Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, Secretaria da Inspeção do
Trabalho e Instituto Nacional do Seguro Social sejam adequadamente dotados da
estrutura de pessoal, inclusive o necessário apoio técnico e administrativo às
suas atividades de fiscalização e de procuradoria, e os recursos tecnológicos e
físicos compatíveis com tais atividades, em atendimento, inclusive, ao disposto
no art. 37, XXII da Constituição Federal, segundo o qual “as administrações
tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
atividades essenciais ao funcionamento do Estado, exercidas por servidores de
carreiras específicas, terão recursos prioritários para a realização de suas
atividades e atuarão de forma integrada, inclusive com o compartilhamento de
cadastros e de informações fiscais, na forma da lei ou convênio.”
k) cobrança da dívida ativa da
Fazenda Pública
Ao
lado do fortalecimento das instituições voltadas à fiscalização de tributos e à
execução da dívida ativa tributária, impõe-se a modernização e atualização da
própria legislação que rege essa execução fiscal, tema que foi objeto da
análise do Consultor Legislativo do Senado Federal Pedro Fernando Nery (DOC
247) e pelo Presidente do SINPROFAZ, Achilles Linhares de Campos Frias (DOC
254) em resposta a questionamentos desta Relatoria.
A
reforma da Lei de Execução Fiscal foi proposta ao Congresso Nacional em 2009,
quando do encaminhamento, pelo Presidente da República, do Projeto de Lei nº
5.080, de 2009, que “dispõe sobre a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública
e dá outras providências”, o qual atualiza e moderniza a execução fiscal
regulada pela Lei nº 6.830, de 1980, permitindo a aceleração dos trâmites
administrativos e judiciais.
Havendo,
assim, proposta em tramitação, cujo conteúdo resulta de estudos realizados por
equipes técnicas qualificadas e com o assessoramento de juristas, caberia à
Câmara dos Deputados proceder ao exame da matéria, em regime de urgência, para
que esta Casa possa então se manifestar.
Dessa
forma, consideramos necessário que esta CPI encaminhe ao Ministro Chefe da Casa
Civil a recomendação de que seja examinada a possibilidade de que o Chefe do
Poder Executivo requeira a urgência constitucional para a tramitação do PL
5.080, de 2009, a fim de que a tramitação da matéria seja acelerada e a Câmara
dos Deputados conclua o seu exame.
l) decadência dos débitos
originados por contribuições sociais
A
Lei nº 8.212, de 1991 estabeleceu seus arts. 45 e 46 que o prazo de decadência
dos débitos originários das contribuições da seguridade social era de 10 anos.
Entretanto,
o Código Tributário Nacional estabelece no seu art. 173 o prazo decadencial de
05 anos para os créditos de natureza tributária.
Além
disso, o parágrafo único do art. 5º, do Decreto-Lei nº 1.569, de 1977, tratava
da suspensão da contagem do prazo prescricional para as causas de pequeno valor
referente às execuções fiscais e créditos tributários.
A
alegação era de que o referido Decreto-Lei seria de natureza processual e assim
sua matéria não estaria sob a reserva da lei complementar.
Em
face desta dicotomia legal, o STF, em sessão plenária de 11 de junho de 2008,
deliberou por negar provimento aos Recursos Extraordinários nº 556664, 559882,
559943 e 560626, que declararam inconstitucionais os artigos 45 e 46 da Lei
8.212, de 1991, reconhecendo que apenas lei complementar pode dispor
sobre normas gerais em matéria tributária.
A
inconstitucionalidade reconhecida Supremo Tribunal Federal originou a Súmula
Vinculante nº 08 que dispõe: “São inconstitucionais o parágrafo único do artigo
5º do Decreto-lei 1569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que tratam de
prescrição e decadência de crédito tributário”.
Assim,
na sistemática atual, após o transcurso de cinco anos estão prescritos os
créditos de natureza tributária originados pelo não pagamento de contribuições
sociais devidas à seguridade social.
Os
artigos da Lei nº 8.212, de 1991, mesmo se fossem restabelecidos pela via de
lei complementar, não seriam mais contemporâneos.
A
cobrança da dívida ativa da seguridade social deve estar em harmonia com o
prazo de carência estabelecido para a concessão dos benefícios de prestação
continuada de aposentadoria do RGPS, sob pena de subtração de receitas que
compõem o salário-de-contribuição do segurado.
A
CPIPREV defende, portanto, que seja imediatamente corrigida esta distorção,
para que a lei complementar harmonize o prazo de prescrição e decadência desses
créditos com o prazo de carência definido para concessão do benefício de aposentadoria
pelo RGPS, que atualmente é de 15 anos
m) classificação dos créditos
tributários em discussão na órbita administrativa e judicial
Durante
os trabalhos da CPIPREV ficou demonstrada a dificuldade de se aferir com
precisão os processos administrativos e judiciais que envolvem a discussão de
passivos tributários originados pelo não pagamento de contribuições sociais
devidas pela seguridade social.
Neste
sentido foram as respostas a requerimentos destinados aos Tribunais Regionais
Federais – TRF’s.
Assim,
recomenda a relatoria desta CPIPREV aos órgãos do Poder Judiciário, que na
distribuição dos feitos judiciais relativos às execuções fiscais seja procedida
a classificação da espécie de tributo e do valor executado, de tal forma que
estas informações possam servir de orientação à formulação de políticas tanto
por parte do Poder Executivo, como de medidas legislativas que posam ser
adotadas pelo Poder Legislativo, e de outras medidas a cargo do Poder
Judiciário.
Da
mesma forma, recomenda-se que a Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB)
promova as adequações e os procedimentos administrativos necessários no âmbito
do processo administrativo fiscal, para o cumprimento deste intento, assim como
a Procuradoria da Fazenda Nacional (PGFN) se esforce para assim proceder.
n) aparelhamento e fortalecimento
dos órgãos responsáveis pelo Processo Administrativo Fiscal
A
falta de estrutura adequada nos órgãos de julgamento dos recursos em processo
administrativo fiscal implica postergar decisão administrativa que impacta na
arrecadação de contribuições sociais.
Em
auditoria conjunta realizada pelo TCU e CGU – (Processo TC 011.645/2015-6),
ficou demonstrada a precariedade e falta de transparência com que os processos
administrativos fiscais são tramitados e julgados naquele órgão administrativo,
que envolvem valores de R$ 567,9 bilhões, distribuídos em 118.324 processos
(posição em outubro/2015).
No
ritmo atual, segundo o relatório, o CARF levaria 77 anos para julgar
todo o estoque de recursos caso novos processos não fossem apresentados para
sua análise.
Lembramos
que o processo administrativo fiscal implica a suspensão da exigibilidade dos
tributos até o desenlace administrativo final com o julgamento do caso pelo
CARF. Mas não é só isso, pois o fim do processo administrativo fiscal implica,
via de regra, o início do contencioso judicial, que leva mais um longo período
para ter solução definitiva.
Tal
expediente, na forma como está previsto atualmente em nossa legislação, é um
estímulo à sonegação e representa a subtração de importantes recursos à
seguridade social.
Recomenda-se
ao TCU; ao Ministro da Fazenda e ao Secretário da Receita Federal do Brasil que
em caráter emergencial reforcem a estrutura desses órgãos e promovam mutirões
para o julgamento de todos os recursos administrativos que envolvam
contribuições sociais até o fim do ano de 2018, além de implementarem
imediatamente as determinações contidas no Acórdão nº 1076/2016 – TCU –
Plenário.
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